Treze anos após o encerramento da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em 2010, uma nova CPI chegou ao seu fim em 27 de setembro de 2023, marcando um retorno à discussão sobre esse movimento social. No entanto, a análise da cobertura midiática revela um viés notório, onde a imprensa frequentemente criminaliza o MST, mesmo quando a CPI não apresenta evidências convincentes.
Ricardo Salles (PL-SP), o relator da CPI, e o presidente Tenente-Coronel Zucco (Republicanos-RS), viram a força da CPI se dissipar ao longo de cinco meses de investigação, não conseguindo estender seu mandato o suficiente para emitir um relatório final. Durante todo esse processo, o Coletivo Brasil de Comunicação Social, conhecido como Intervozes, monitorou a cobertura da imprensa sobre o tema.
A análise da cobertura da CPI de 2023 revelou uma tendência de utilizar termos negativos e pejorativos para se referir ao MST e suas ações, criando uma atmosfera negativa ao redor do movimento. O Estadão publicou 110 matérias, das quais 79 continham termos negativos relacionados ao MST. A Folha publicou 33 matérias, com palavras negativas presentes em 65% delas. O Globo, em 53 das 75 publicações, também empregou termos negativos, muitas vezes utilizando a palavra “invasão” e suas variantes para dar um tom de violência e ilegalidade às ações do MST.
O monitoramento abrangeu diversos veículos de comunicação, incluindo jornais impressos, televisão e portais online. No entanto, vale destacar que a Agência Brasil demonstrou uma perspectiva diferente, com menos termos pejorativos e um maior equilíbrio de fontes a favor e contra o MST.
É notável que, mesmo com amplo apoio de veículos comerciais de grande audiência, o agronegócio busca ter sua própria mídia. O portal R7, por exemplo, publicou 51 matérias com viés contrário ao MST, enquanto a Agência Brasil adotou uma abordagem mais equilibrada, incluindo fontes favoráveis ao movimento. Essa disparidade reflete a influência do agronegócio na narrativa midiática.
Os editoriais dos jornais impressos também desempenharam um papel na formação da opinião pública. O Estadão publicou uma série de editoriais focados em criticar o governo federal e associar o MST a ações negativas. O Globo seguiu uma abordagem semelhante, priorizando as “invasões” e tentando vincular o governo a elas de maneira negativa.
Além disso, a CPI também destacou episódios de violência política de gênero, especialmente contra a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP). A imprensa, em alguns casos, minimizou esses episódios, retratando-os como simples “bate-bocas”. No entanto, a sociedade rejeitou essa abordagem, reconhecendo a violência política de gênero e condenando-a.
Embora a cobertura midiática tenha frequentemente enfocado o aspecto negativo do MST e de suas ações, não se destacaram informações sobre a organização, sua luta pela reforma agrária, e seu compromisso com a educação e a formação de seus membros.
O MST se orgulha de suas realizações, com uma organização presente em 24 estados e cerca de 450 mil famílias que conquistaram a terra por meio da luta e organização. O movimento também angariou apoio internacional, com Comitês de Amigos em 12 países. É importante lembrar que o MST não comete “invasões” ilegais, mas sim ocupações de terras como uma forma de pressionar para que se cumpra a Constituição, que estabelece a desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária.
Embora a imprensa muitas vezes se concentre nos aspectos negativos e controversos, a realidade do MST e seu papel na sociedade brasileira é muito mais ampla e complexa do que a narrativa predominante apresenta.
Descrição da Imagem: A imagem que complementa esta notícia destaca uma família de agricultores sem-terra trabalhando em um campo verdejante. As crianças estão na escola, enquanto os adultos estão ocupados na agricultura. A imagem transmite a ideia de luta, resistência e construção de um futuro melhor por meio da reforma agrária. É um lembrete visual de que por trás das manchetes sensacionalistas, há uma comunidade dedicada à causa da reforma agrária e da justiça social no campo brasileiro.